Na última semana fui bombardeado com mensagens e fotos sobre a GoFit (startup de delivery de combustíveis). As reações foram imediatas, diversos órgãos demonstrando que a operação é ilegal, já que no Brasil a atividade não é permitida pela legislação.
As distribuidoras estão surfando a onda da mudança diária de preços da Petrobras e aumentando a margem, são também contra novos modelos, pobre do revendedor que não tem o direito nem de opinar, é mudo, só lhe resta obedecer.
Esta “novidade” no Brasil já é realidade lá fora e todos estão cansados de saber. Esperávamos o oposto, que os órgãos reguladores fossem mais atualizados e buscassem regular soluções e inovações que surgem também no exterior.
Muitos questionam o proprietário da startup ter uma dívida bilhões de impostos, originária de refinaria em débito com o governo. Mas o problema está no criador ou na criatura? Se isso fosse criado por jovens inovadores tentando mudar o nosso segmento, você apoiaria?
A verdade é que esse modelo proposto provoca uma ruptura com os padrões, modelos ou tecnologias já existentes no mercado. Não é fácil testar MVP (minimo produto viável), ainda mais num mercado tradicional e cheio de amarras onde poucos players possuem uma força enorme.
Concordo com essa indignação em partes, tudo deve ser feito na legalidade e com impostos recolhidos devidamente, isso deveria ser o básico, mas a obrigação é da Secretaria de Fazenda, não da ANP, que é órgão regulador das atividades que integram as Indústrias de Petróleo e Gás Natural e de Biocombustíveis no Brasil.
Penso: “nosso mercado está num momento crítico, baixíssimas margens, revendedores quebrados, iremos persistir no modelo atual ou daremos o primeiro passo para aceitar a inovação? Somos os taxistas brigando contra a Uber?”
Pegue como exemplo os taxistas: entenderam que a ameaça era oportunidade e hoje fazem corridas via aplicativo.
É normal que um modelo disruptivo aconteça antes da regulação, afinal é uma novidade e vem para quebrar paradigmas. Uma tecnologia disruptiva nasce normalmente por 3 fatores:
1. A saciação cria condições para a disrupção.
2. A disrupção provém da quebra de regras.
3. A inovação do modelo de negócios normalmente propulsiona a disrupção.
É controversa a permissão há muitos anos do TRR revender óleo diesel e tanto bloqueio para a regulação de gasolina e etanol em modelo semelhante. Se os problemas principais são a segurança e controle ambiental, o Diesel é bem pior que a Gasolina e o Etanol, pela pouca solubilidade em água. Este produto se deposita no fundo de aquíferos, o que torna sua extração mais difícil. Além de hidrocarbonetos, o diesel possui enxofre e nitrogênio que, se misturados à água, podem favorecer a proliferação de microrganismos e produzir gases.
O transporte do diesel é muito mais perigoso, ou você acredita que entregar o produto em fazendas com estradas péssimas, geradores imundos e sem a mínima segurança pode ser mais seguro que entregar na cidade debaixo do olho da fiscalização e do consumidor vigiando 24h em posts de redes sociais e WhatsApp?
Temos que acordar e entender que esse não é o problema, nossa ameaça é outra, somos nós mesmos. Ficamos parados aguardando o futuro, se teremos carros elétricos, compartilhados, autônomos e não fazemos o dever de casa. Aguardamos outros decidirem o nosso rumo. No dia em que aprendermos que o nosso posto está num local normalmente muito valorizado e que cada m2 vale muito dinheiro, rentabilzaremos de outras formas. O combustível é uma commodity , a tendência é a margem se manter baixa, já que não agregamos nenhum valor ao produto na cadeia produtiva.
Operar um posto de combustíveis é muito simples, temos 5 produtos dentro de tanques subterrâneos e com controle eletrônico, isso representa 99% de nosso faturamento. A grande maioria terceiriza até o lava a jato, porque é trabalhoso e não se preocupa em operar uma loja de conveniência. E você ainda acredita que este delivery realmente é um concorrente para o seu posto? Não seria uma primeira oportunidade de enfrentar o status quo e exigir mudanças mais profundas em nosso segmento?
Sobre o modelo de negócio, tenho minhas dúvidas, o custo de operação é alto, demanda de uma logística muito eficiente, confiança do cliente. É um serviço de difícil promoção de abrangência, os postos são bem localizados por um motivo bem nobre. O cliente que solicitar este tipo de serviço, às vezes terá que abrir o portão, por vezes colocar carro na rua, acompanhar o serviço e estas podem ser dores maiores que ir abastecer em um posto que já está no seu caminho.
Não estamos nos EUA, dizer que isso funcionou lá (ainda não tive evidências disso) não é garantia para funcionar aqui. Isso vai ser bom em área rural, onde o posto está longe, mas nem Uber chegou lá ainda, então, vamos ter paciência, early adopters e outliers nunca sustentaram nenhuma empresa no mercado e só o tempo dirá se isso é sustentável. Se o cliente disser que é viável e quiser esse modelo, assim será.
Um modelo de negócio diferente é quando adequa-se a oferta de um produto ou serviço já estabelecido em determinado mercado para outros novos mercados.
Quem somos nós para tentar mudar os desejos e vontades do nosso cliente, se assim ele quiser, assim será e o revendedor vai atendê- lo, a ANP irá se adequar e o governo vai apoiar, pois é a vontade do povo que prevalece num governo democrático.
Nós, meros revendedores de um mercado em extinção nos reinventaremos, não somos bobos, somos comerciantes e venderemos o que o nosso cliente desejar.