Olhando para a história da revenda de combustíveis no Brasil, compreende-se que, antigamente, ter um posto bandeirado era sinônimo de ser escolhido, de ter sido preterido. Durante anos isso se tornou quase cartorial, ou seja, apenas revendedores com muita relação com as distribuidoras tinham postos bandeirados.
Hoje em dia é bem diferente, pois as leis mudaram e o posto de combustíveis passou de uma concessão (estados + distribuidoras) e passou a ser um negócio regulado, como outro qualquer.
No texto de hoje, vou explicar um pouco sobre a história recente das relações entre Petrobras, distribuidoras e postos revendedores e também dar algumas dicas sobre o que é preciso levar em conta no momento da escolha entre bandeirar um posto ou não. Continue a leitura!
Por que o bandeiramento virou sinônimo de sofrimento na revenda?
A crise enfrentada pela Petrobras em 2014/2015 abriu as portas da importação de produtos para atender o mercado interno. Dólar e barril de petróleo baixos,criaram um segmento do comércio de derivados no Brasil: os importadores, que rapidamente se organizaram e já estavam operando na maioria dos portos que tinham condições de recebê-los.
Com diferenças de preços absurdas, os navios começaram a chegar em solo brasileiro. Logo, um problema ficou em evidência: toda a infraestrutura de armazenagem era antiga e estava acostumada com navios semanais da Petróleo Brasil S/A e não foi párea para os navios de importação. A solução era desovar os produtos o mais rápido possível para que o novo navio não ficasse parado aguardando espaço.
Então começou o que podemos chamar de problema para as distribuidoras e salvação para os postos. O único jeito foi derrubar os preços. Muitas distribuidoras não se importaram e continuaram a comprar da Petrobras, mas quando os preços caíram ao chão, a guerra entre postos bandeirados e postos bandeira branca começou.
Algumas distribuidoras usavam o produto Petrobras, que era mais caro, para atender seus contratados e o produto importado com os postos bandeira branca. Algumas faziam preços médios, enquanto outras estavam amargando o título de “careiras”, passando a impressão de que estavam ganhando horrores nas costas de seus clientes, quando na verdade estavam com margem zero tentando se aproximar do preço praticado no mercado.
Crise no relacionamento bandeira x bandeirado
Acostumados com um mercado estável, com alterações de preços anuais e com muito pouco acesso a informações, os anos seguintes foram transformadores. As distribuidoras se adaptaram e criaram departamentos de pricing (inteligência de preços). Organizaram os setores de compras, gestão de estoques, armazenagem e conseguiram começar a lucrar com a valorização de estoques. A revenda não mudou muito. Apenas classificou as distribuidoras como responsáveis pelas enormes diferenças de preços e passaram a tentar sair ou se esquivar dos seus contratos.
As grandes redes demoraram um pouco, mas conseguiram se adaptar, negociar contratos mais flexíveis e então passaram a crescer novamente. A grande maioria da revenda tem medo de contrato. Seja por não entender ou pelos relatos daqueles que passaram “perrengues” nos anos passados e simplesmente largaram às distribuidoras a culpa pelos seus fracassos. Hoje, o clima é totalmente voltado para sair dos contratos, por isso, poucos pensam em negociar contratos mais flexíveis ou então tentar uma negociação com o barco andando.
Sem dados específicos ou estudos que comprovem isso, existe, entre os revendedores, a ideia de que os postos denominados marca própria têm mais margem que os bandeirados e assim continuam a entrar no mercado centenas de postos novos enquanto umas dezenas fecham todos os meses.
A conta que poucos fazem, mas que é cobrada todos os dias
Todos são unânimes em afirmar que o contrato com a bandeira possui ligação direta com pagar preços mais caros. Isto não está em pauta, pois trata-se da mais absoluta verdade. A conta que não é feita, é do capital empregado em imagem. Valores e tempo para a geração de uma marca. Qual o custo do capital de giro, dos limites de compra liberados pelas distribuidoras? Qual o custo do risco financeiro, da inadimplência? O custo das consultorias? São tantos fatores que não tem como contabilizar diretamente, mas tem-se um impacto no negócio e, que apesar de imensurável, demonstra a capacidade de vivificar essa parceria.
A verdade é que parte da revenda só olha para valores diretos. Quanto vou pagar e quanto vou receber. Essa é a linguagem das negociações. Nem mesmo as distribuidoras conseguem medir seus valores e quantificar seu suporte. Isto se dá porque o mercado não quer saber. Quer dinheiro. Os questionamentos mais ouvidos são: “Quanto vou receber”, “Quando e quanto vou pagar mais caro por isso” etc.
Todas essas transformações ocorridas no mercado de combustíveis demonstram que cada dia mais será exigido dos revendedores valores antes não medidos. Qual o potencial do seu posto? Quantas pessoas compram aqui todos os dias? Quantas só compram uma vez, quantas nunca mais voltaram? Quantos postos cobram juros por prazo de compra aos seus clientes PJ? Quanto se perde por não ter um financeiro austero e vigilante? Não se trata mais de: Vendi x litros e apurei y. Por isso se abrem e fecham tantos postos todos os dias.
Os novos entrantes sabem pouco disso. A indústria de construção de postos demonstra que é bem simples abrir um. O fato de fulano ou sicrano ter comprado uma Hilux demonstra que o mercado é bom. É só colocar gasolina e pronto, vender, apurar e comprar de novo. Quem nunca ouviu alguma dessas frases? Quantos revendedores sabem, de cor, as taxas de cartão de crédito? Você vende 3 produtos, uma empresa tira 20% a 40% da tua margem bruta e você não sabe qual é a taxa? A revenda precisa se profissionalizar nesse aspecto e quem mais sofre são os pequenos.
Afinal, bandeira branca (marca própria) ou bandeira (contrato de franquia)?
O contrato de fidelidade a uma bandeira não é um casamento. Se assim quiser encarar, pode até ser, mas com data de início e fim. A questão não é perguntar se devo ser bandeira ou não, mas sim qual a melhor estratégia para o posto? Qual das opções são mais viáveis economicamente falando? Não só do preço de compra, mas de todo o conjunto ofertado. Quão conhecida é a marca que quero me associar? Consigo fazer um trabalho relevante para a região com essa marca? Essa associação pode me ajudar a vender mais?
Quais demais fatores estão na mesa de oferta da bandeira? Prazo? Limite? Quem comprou em 2020/2021 viu que limite faz uma diferença danada no negócio. Quão flexível é meu contrato a ponto da saída ser menos dolorosa financeiramente? Não se trata de fazer um leilão e perguntar quem dá mais e sim usar do pensamento estratégico. É tão comum revendedores negociarem fidelidade e depois receberem um monte de contratos para assinar porque não se lembram de negociar os contratos.
Qual revendedor chama seu gestor para discutir um contrato? Envolve dinheiro, por isso muitos guardam para si. Confiam o maior negócio nas mãos do gerente, mas são incapazes de envolvê-los no processo. Talvez seja melhor a opção de se manter bandeira branca porque assim você terá liberdade de compra.
Use de estratégia. Se quer bandeirar, monte a estratégia baseada nos anos de contratos. Se quer ficar bandeira branca, monte a estratégia de 5 anos com metas e objetivos bem definidos. Comprar mais barato pode ser muito estratégico, mas não é toda a estratégia que você precisa para sobreviver ao novo varejo, vai precisar de muito mais.
Roberto James
Especialista em comportamento do consumidor
CANAL DO ERREJOTA